A importância do Patrimônio Industrial

Escrito por: Equipe INGÁ, em fevereiro de 2025.


O patrimônio industrial desempenha um papel fundamental tanto nas áreas de antropologia, sociologia, história, por ser um recurso para se aprender sobre os modelos de trabalho e de viver do passado, conforme descrito na Carta de Nizhny Tagil sobre o patrimônio industrial, carta patrimonial elaborada em 2003; quanto na área de arquitetura e urbanismo, pois é um registro do desenvolvimento territorial e da transformação da paisagem, além de marcar a mudança de estilos e materialidade, através da introdução e consolidação de diversas tipologias e uso de novas técnicas e materiais construtivos.

 

A industrialização paulista


A transformação de São Paulo, tanto em termos físicos quanto sociais, foi impulsionada pela expansão da cultura do café e a riqueza gerada por essa atividade durante a Primeira República (1889-1930). A necessidade de transportar café e outras mercadorias, bem como passageiros do interior do estado para o porto de Santos, levou à construção da São Paulo Railway em 1862, que foi inaugurada em 1867. Após a concessão do governo expirar, em 1946, ela se tornou propriedade da União e passou a ser chamada de Estrada de Ferro Santos-Jundiaí (EFSJ). Isso levou a uma reestruturação das vias de transporte, redesenhando os padrões de ocupação, circulação e expansão da cidade.


No final do século XIX, uma onda de imigração, principalmente da Europa, redefiniu as estruturas sociais do Brasil, esses imigrantes representavam um novo mercado consumidor e força de trabalho. Muitos deles também investiram na criação de empresas e indústrias, que desempenharam um papel crucial no desenvolvimento da infraestrutura da cidade de São Paulo, incluindo ferrovias e hidrelétricas.


Embora a industrialização no Brasil tenha começado no início do século XIX, principalmente no Rio de Janeiro, Pernambuco e Bahia, a indústria em São Paulo cresceu rapidamente entre 1907 e 1919, superando outras regiões, como o Rio de Janeiro. A partir de 1919, São Paulo diversificou sua produção para atender ao mercado nacional.


Devido à crise em 1929 – conhecida como “A Grande Depressão”, causada pela quebra da Bolsa de Nova Iorque – que assolou os Estados Unidos, maior comprador de café brasileiro, o mercado cafeeiro foi seriamente afetado. Contudo, parte dos cafeicultores investiram suas reservas financeiras no setor industrial, impulsionando seu desenvolvimento. Fato esse que contribuiu significativamente para a recuperação econômica do Brasil a partir de 1933, com o setor industrial diversificando suas atividades e incorporando indústrias químicas, metalúrgicas, plásticas, de transporte, mecânicas, de borracha e elétricas.


Na década de 1950, o Plano de Metas do governo de Juscelino Kubitschek atraiu grandes multinacionais, criando uma concentração industrial na Grande São Paulo, com destaque para a indústria automobilística. No entanto, essa concentração industrial resultou em desigualdades econômicas regionais, já que São Paulo dominava grande parte da produção nacional, especialmente na indústria automobilística e sua cadeia de suprimentos, localizada principalmente na Região Metropolitana de São Paulo, que inclui cidades como Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, ocasionando um crescimento desordenado da cidade e problemas socioespaciais.


Para combater essa desigualdade inter-regional, o governo federal, na década de 1970, começou a oferecer incentivos fiscais para a descentralização industrial em São Paulo. Outro fator importante para a interiorização da indústria foi a queda do transporte ferroviário e o aumento das rodovias nas décadas de 1950 e 1960, permitindo instalações maiores e mais modernas ao longo dessas estradas.


Posto que estas transformações tenham gerado o abandono de muitos edifícios industriais da era áurea da cidade, e em alguns casos, à sua demolição e substituição por novos empreendimentos, ainda existem bairros que mantêm a paisagem urbana daquela época, com fábricas e depósitos, e alguns deles ainda estão em operação.

 

Os bairros operários


A São Paulo Railway, a primeira companhia ferroviária de São Paulo, desempenhou um papel fundamental na organização dos fluxos urbanos e agrupamentos em torno de suas estações. Isso promoveu o crescimento de conjuntos industriais e vilas operárias próximas a essas estações.


No início do século XIX, esse crescimento foi mais evidente nos bairros próximos ao centro, como o Brás e a Mooca. Em 1895, esses locais já estavam urbanizados e abrigavam indústrias próximas à ferrovia, como a "Fábrica Bavária de Cerveja e Gelo" (Companhia Antártica Paulista) na antiga avenida Bavária, atual avenida Presidente Wilson.


O Ipiranga, por outro lado, era uma região pouco habitada no início, principalmente de passagem. Sua paisagem era caracterizada por colinas, vastas áreas desocupadas e o Museu Paulista. A construção do Museu Paulista em 1885-1890 levou à criação da Estação Ipiranga em 1886. A ocupação urbana e industrial significativa começou no início do século XX, nas áreas próximas ao Museu e à estação.


A Vila Prudente se formou em torno do "Estabelecimento Irmãos Falchi", uma empresa de três irmãos italianos que inicialmente atuavam no comércio. Em 1890, o bairro foi loteado e surgiram a Fábrica de Chocolates Falchi e a Companhia Cerâmica, que produzia tijolos e telhas para as residências dos funcionários, a maioria deles imigrantes italianos. Além dos Irmãos Falchi, outros estrangeiros investiram na criação de novas indústrias, incluindo a "Cerâmica Sacoman Frères" no Ipiranga, pioneira na fabricação de telhas e tijolos utilizados em importantes obras, como a Estação da Luz e o Museu do Ipiranga.


Além das indústrias têxteis e cerâmicas, a região viu um aumento significativo nas indústrias metalúrgicas, de gás, petróleo e automobilísticas a partir da década de 1920, criando uma cadeia produtiva na área. A Avenida Presidente Wilson, originalmente construída para atender à Companhia Antártica Paulista, tornou-se um importante eixo conectando várias fábricas, contribuindo para a integração do complexo industrial e produtivo.


O patrimônio industrial de São Paulo reflete não apenas a história econômica, mas também a transformação urbana ao longo dos anos. O legado das indústrias e fábricas do passado ainda é visível em muitos bairros da cidade, lembrando-nos da importância dessas estruturas na construção do São Paulo moderno. É nosso dever preservar e valorizar esse patrimônio, pois ele conta a história de nossa evolução como sociedade industrial e urbana.


Até a próxima leitura!